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  • “Incomum” no Brasil, Samba é nome popular entre pessoas de países africanos
    O ritmo que embala o carnaval brasileiro também é nome próprio na Gâmbia, país da África Ocidental onde o jornalista Samba Jawo nasceu. Encontrar “xarás” não é dificuldade alguma para ele. “É um nome muito comum na etnia Fulani. Na nossa cultura significa o segundo filho”, explica o gambiano que tem um irmão mais velho e três mais novos. Fã declarado de futebol, ele diz que foi por meio deste esporte que conheceu o ritmo brasileiro mais famoso, que tem o mesmo nome que ele. Vinícius Assis, correspondente da RFI em Adis Abeba, Etiópia Há séculos, muitas pessoas em países do continente africano, principalmente na região do Sahel, recebem o mesmo nome que o cantor brasileiro Seu Jorge e sua companheira, Karina Barbieri, resolveram dar ao seu filho. Mas, no Brasil, a escolha causou polêmica no mês passado, quando o bebê nasceu. Uma funcionária do 28º Cartório de Registro Civil das Pessoas Naturais, na maternidade onde a criança nasceu, no bairro Itaim Bibi, Zona Sul da capital paulista, se recusou a emitir a certidão de nascimento do menino por considerar o nome “incomum". O caso foi parar na Justiça e terminou com vitória para os pais. Seu Jorge agora é, mesmo, o pai do Samba. O jornalista da Gâmbia se mostrou surpreso ao saber da situação enfrentada pelo cantor brasileiro e sua companheira. “É direito deles dar ao filho o nome que quiserem, e negar isso é violar o direito do casal”, comentou. No Brasil, a norma nos cartórios é seguir a lei 6.015, criada em 1973, que regulamenta os registros públicos no país. E foi baseada no artigo 55 desta lei que a oficial do cartório se negou a registrar a criança como Samba em São Paulo. O primeiro parágrafo deste artigo da lei afirma que: O oficial de registro civil não registrará prenomes suscetíveis de expor ao ridículo seus portadores, observado que, quando os genitores não se conformarem com a recusa do oficial, este submeterá por escrito o caso à decisão do juiz competente, independentemente da cobrança de quaisquer emolumentos.  Mas para o pesquisador de culturas negras e história da África Salloma Salomão, o episódio foi uma prática autoritária do cartório. “Os ativistas negros no Brasil, a partir da década de 1940, começaram a colocar nomes africanos ou indígenas nos filhos. Nós estamos vivendo, talvez, o terceiro ciclo dessa prática, que ė uma tentativa de reconexão com as civilizações africanas. Mas a estrutura institucional brasileira continua sendo o que sempre foi: racista”, ele critica.   "Samba, Sambo, Sambe, Sambará" O pesquisador lembra que, quando escravizados, os africanos eram seres humanos que tinham nomes, identidades, comunidades, cultura, civilização. Eles passaram a ser capturados e exportados como se fossem objetos. E essas pessoas de origem centro-africana, em sua maioria, ocasionalmente poderiam ter na origem o nome Samba ou outras variações, como Sambeh e Sambará. “Nomes nativos, mas também de influência islâmica, hebraica, aramaica”, ele explica. Salomão conta que analisou recentemente arquivos de viagens marítimas entre 1807 e 1850. De acordo com o pesquisador, navios foram capturados pela marinha britânica e desviados para a Libéria e Serra Leoa. As pessoas nessas embarcações foram recapturadas pelos ingleses e catalogadas mediante nome, idade aproximada, origem étnica. “Nos documentos daqueles que foram recapturados pela marinha britânica há aproximadamente 200 pessoas com nome Samba, Sambo, Sambe, Sambará”, afirma. Dentro de uma pesquisa mais ampla que ele tem feito sobre o gênero musical conhecido no Brasil desde o inicio do século 20 como samba, o pesquisador destaca que o gênero urbano nunca foi associado a uma pessoa. Mas na África Central, e mesmo no Senegal, samba é nome próprio. “Na costa atlântica, na costa índica e na região dos lagos, tinha e tem pessoas de nome samba e também suas derivações”, ele explica. Não deixar um negro usar o nome que quiser não é novidade. Ele ainda destaca que no passado não era permitido às pessoas escravizadas manter seus nomes africanos. Na maioria das vezes, estas recebiam nomes comuns na cultura de quem os capturavam. “Em situações muito especiais, pessoas africanas capturadas, transformadas em escravizadas e que obtinham sua liberdade, conseguiam recuperar seus nomes de origem”, ressalta Salomão. Bairro em Luanda Samba também é o nome de um bairro em Luanda, capital de Angola, onde há ainda um estilo musical de raiz chamado semba, palavra que significa umbigada em kimbundu, um dos idiomas falados em Angola. “A teoria para o gênero musical samba é que este deriva de um gênero musical chamado semba da região onde hoje é Angola, mas essas duas palavras coabitam em Angola”, esclareceu o pesquisador. De acordo com sua hipótese, uma pessoa de nome Samba produzia uma musicalidade no nordeste brasileiro, por volta de 1820. Essa pessoa era uma liderança muito importantemente entre libertos, alforriados e escravizados. “As festas que essa pessoa chamada Samba, que não dá para saber se era homem ou mulher, produzia eram de tal forma importantes que derivaram o nome de uma prática cultural. Essa é minha hipótese”, revela. O pesquisador conclui afirmando que “o racismo só é eficiente porque é combinado com uma profunda ignorância”. A brasileira Sara Rodrigues conta que há quase dez anos conheceu um homem vindo de um país africano que se chamava Samba. Ele fazia intercâmbio na Universidade Federal da Bahia. Atualmente a baiana mora na África do Sul, onde o significado do nome é algo considerado especial na cultura negra local. “O nome da minha filha, de pai preto sul-alfricano, é Kwena, que significa crocodilo. O significado em si não se trata do crocodilo, mas do que o animal representa”, ela explica. A menina foi registrada no Brasil. A mãe, que faz mestrado na área de Literatura e Cultura, conta que não teve problemas com o registro, e destaca que deu à menina um nome composto: Kwena Dandara. Quando um estrangeiro de nome “incomum” se apresenta a um negro na África do Sul costuma ser indagado sobre o significado do nome. Nelson "Rolihlahla" Mandela Ainda de acordo com a brasileira, que pesquisa culturas sul-africanas na Cidade do Cabo, antigamente era comum colocar nome composto no país onde vive. “Um em língua indígena e outro bíblico”, esclarece. O sul-africano mais famoso do mundo ficou internacionalmente conhecido por um nome que não era originalmente seu. Nelson Mandela se chamava, na verdade, Rolihlahla, que significa "aquele que veio para fazer barulho". Mas era comum na época em que ele começou a ir para a escola que professores ingleses mudassem os nomes dos alunos negros na África do Sul. Se por um lado parece ser uma tendência ver brasileiros se inspirando no continente africano para escolher nomes de seus filhos, por outro, o Ocidente também ainda influencia pais africanos. É muito comum encontrar palavras em inglês usadas como nomes de pessoas, principalmente em uma parte específica do continente. “Geralmente, pessoas com nomes como Blessing, Sweetboy, Reason são mais encontradas no Zimbábue do que na África do Sul”, conta Sara, que incentiva o uso de nomes tradicionalmente africanos em crianças brasileiras, mas desde que os pais entendam seus significados, como fazem os africanos.
    2/19/2023
    6:08
  • Brasileira documenta sofrimento de deslocados por terrorismo islâmico em Moçambique
    Desde abril, a carioca Mariana Abdalla mora em Moçambique, país africano de língua portuguesa famoso pelo litoral paradisíaco, mas que há cinco anos passou a ser motivo de preocupação internacional. A província de Cabo Delgado, no norte moçambicano, começou a ser alvo de ataques de terroristas ligados ao grupo Estado Islâmico em outubro de 2017. Vinicius Assis, correspondente da RFI na Etiópia As ações extremistas já causaram cerca de 4 mil mortes e fizeram quase um milhão de pessoas se deslocarem em Moçambique. Dados da Agência da ONU para Refugiados (Acnur) mostram que 946.508 vítimas fugiram das áreas onde viviam para tentar sobreviver. Mariana Abdalla mora atualmente na cidade de Pemba, capital desta província onde os ataques vêm acontecendo, a cerca de 2.500 km da capital moçambicana, Maputo. Ela tem tido contato direto com quem está sendo afetado por essa situação. “É um conflito que poucas pessoas conhecem”, nota a brasileira. Depois de seis meses e meio na região, ela conta que também acaba pegando um pouco as dores daqueles com os quais tem contato. “Você vê pessoas que estão há cinco anos se deslocando sem parar, sempre procurando um lugar mais estável”, detalhou. Segundo a brasileira, a maioria das pessoas afetadas por esses ataques viveu experiências muito traumáticas. “Presenciar um assassinato de ente queridos, filhos que não sabem onde estão os pais, órfãos, mães que deixaram os filhos, tudo isso também vai te afetando, e a empatia aflorando. Eu sinto que já estou muito impactada com tudo isso”, disse. Mariana começou cedo a entender, na prática, a ideia do que é ter uma vida de nômade. Ela passou parte da infância e da adolescência na Colômbia e na China com a família. A “paixão por outras culturas” a fez se formar em Relações Internacionais. A vontade de contar histórias, em vídeos e fotos, a levou a um mestrado mais voltado para a comunicação. Moçambique não foi o primeiro país africano que ela conheceu. Durante o mestrado, por exemplo, teve uma estadia em Uganda. Há quatro anos, ela trabalha para a ONG Médicos Sem Fronteiras. Hoje, é gestora de comunicação da organização em Moçambique. “É um lugar de difícil acesso. Por isso, é um privilégio, uma responsabilidade muito grande poder contar essas histórias, poder passar para outras pessoas o que está acontecendo”, disse. O cenário na região de Cabo Delgado ainda é volátil. As vítimas que sobreviveram aos conflitos estão constantemente com medo e traumatizadas. Algumas testemunharam massacres. Outras não sabem onde está parte da família. Como essa parcela da população carente já tinha preocupações suficientes para ter a saúde mental profundamente prejudicada, a pandemia do coronavírus não foi prioridade para quem vive nessa região do país. Os que já conseguem voltar para casa muitas vezes encontram seus imóveis destruídos. Tudo isso faz com que os afetados diretamente por esses ataques extremistas não consigam demonstrar expectativas de um futuro estável. Miséria e desalento “Aqui, quando eu pergunto ‘qual é o seu sonho?’, as pessoas têm muita dificuldade em, até mesmo, entender a pergunta. A falta de perspectiva é tão grande, eles estão em um estado de alerta, de sobrevivência tão grande que é muito difícil, até mesmo, pensar no futuro, no que gostariam para si mesmas, a não ser a sobrevivência de agora”, afirmou. Mariana diz que, mesmo vivendo nessa região, nunca encarou uma situação de risco. Ela se lembrou apenas de um período mais tenso. “Na época de junho e julho teve realmente uma onda de violência bastante forte aqui em Cabo Delgado e tiveram ataques mais perto do sul, perto da capital, Pemba, que é onde fica minha base na maior parte do tempo, quando não estou visitando nenhum projeto”, explicou Mariana. Como na época a organização para a qual ela trabalha tentou reduzir bastante a equipe na região, a ida da carioca ao Brasil, para renovação de visto, precisou ser adiantada. “Eu tinha que renovar meu visto no Brasil em duas semanas e eles me perguntaram se eu não podia ir um pouco antes, realmente como uma medida de segurança, para tentar ter o mínimo possível de pessoal aqui”, disse. Ela acabou passando três semanas no Brasil para cuidar da renovação do visto e voltou. O governo de Moçambique demorou muito a admitir a presença de terroristas no norte do país, onde atualmente estão tropas de Ruanda e da Comunidade de Desenvolvimento da África Austral (SADC) ajudando o Exército do país neste combate. Autoridades locais falam em libertação de territórios antes ocupados e uma melhora na região, com insurgentes mais fragilizados. Mas a realidade está longe de ser considerada tranquila e estável. Região rica em gás e pedras preciosas Cabo Delgado é uma região rica em produção de gás natural e rubis, entre outros produtos. A exportação de madeira também tem um grande peso na economia da região, que ainda está na rota internacional do tráfico de drogas. Mas a população de Cabo Delgado pouco se beneficia das cifras produzidas pela riquezas desta parte do país. Os índices de pobreza e analfabetismo no norte de Moçambique também são altos. Como praticamente todas as pessoas que trabalham para ONGs em países africanos, Mariana não comenta as implicações políticas envolvendo esses ataques. A brasileira conta que apesar das dificuldades ao lidar com pessoas que enfrentam tantos problemas, o cenário atual no norte moçambicano a conquistou. Ela lembra que sua ideia, inicialmente, era ficar três meses em uma vaga temporária na equipe de comunicação em Moçambique. “Mas acabei ficando até agora e penso que vou ficar, pelo menos, até dezembro. O contexto, as necessidades, a importância de comunicar sobre esse conflito e o que as pessoas passam me conquistou, digamos assim, porque é uma realidade que poucos conhecem, especialmente no Brasil”, destacou. Mariana reforça que os ataques são localizados no norte de Moçambique, país que ela, inclusive, diz recomendar como destino turístico. Ela segue registrando o máximo que pode com suas câmeras, em uma região onde jornalistas nem sempre têm acesso. Questionada pela reportagem qual é o seu sonho, Mariana respondeu: “O meu sonho é que todas as crises, incluindo a de Moçambique, sejam escutadas da mesma forma", apontou. "Que tenham o mesmo peso, que não haja uma diferenciação tão grande. Pode parecer muito idealista, mas eu acho que esse é o espírito humanitário. Que todos sejam vistos e sejam escutados da mesma forma, e que a comunicação também tenha um papel igual nesse sentido”, concluiu.
    10/23/2022
    6:38
  • Historiadora ensina "etiqueta" a empresários brasileiros que querem fazer negócios com africanos
    Em uma recente reunião com cinco empresários negros na Nigéria, brasileiros não reconheceram Aliko Dangote, o homem mais rico de todo o continente africano, com um patrimônio líquido estimado em US$ 12,6 bilhões. “Para o olhar do empresário brasileiro, todas aquelas pessoas eram as mesmas, estavam vestidas da mesma forma”, relatou a historiadora Carolina Maíra Morais, que presenciou a cena. “Essa leitura rasa sobre o continente é que a gente, primeiro, precisa transpor quando chega do Brasil na África”, frisa. Vinícius de Assis, correspondente da RFI na África Nascida na Baixada Fluminense, há seis anos ela cruza o oceano Atlântico anualmente com destino ao continente africano, principalmente viajando para a Nigéria, país de origem do marido e sócio da brasileira, Ajoyemi Osunleye. Ela conta que percebeu, ao longo desse tempo, que existe uma dificuldade na linguagem cultural entre o empresariado brasileiro e o empresariado de países do continente africano, de uma maneira geral, com as suas particularidades. “São dificuldades, por exemplo, em relação a coisas muito simples, como o tempo, a maneira de falar, a maneira de você se referenciar a pessoa”, disse. Foi aí que a historiadora decidiu, no ano passado, buscar mais um mestrado. Além do que fez em História da África, agora se dedica ao Comércio Exterior, na Universidade Federal do Rio de Janeiro. Ela pesquisa essa linguagem, pensando sempre no que pode fazer para facilitar essas relações. “A gente tem um potencial gigante que o Brasil não explora no continente africano, porque eles são muito receptivos para o empresariado brasileiro, mas o empresariado brasileiro ou não está interessado ou ainda não conseguiu enxergar um campo de negócios forte no continente africano. E tem essas dificuldades de acomodação cultural”, disse. Adaptação transcultural Há cinco anos ela criou uma empresa que tem promovido eventos, recebido comitivas africanas no Brasil e trazido comitivas brasileiras para África, “não só para negócios, mas também para eventos culturais” e ligados à educação. Diz que no mestrado na UFRJ tenta levantar a discussão sobre adaptação transcultural e destaca que percebe uma resistência, às vezes, ou uma falta de cuidado em relação a questões raciais entre empresários brasileiros e empresários africanos. “Não se vê empresários africanos de uma maneira como se olha para os mesmos empresários quando você está lidando com eles no Brasil”, disse. O rígido protocolo da rainha Elizabeth II é mundialmente famoso e tinha que ser respeitado por todos os que conseguiam se aproximar para conseguir algo da monarca, falecida este mês. Da mesma forma, a maneira de se portar diante de empresários africanos é importante. Não por uma exigência banal, um capricho, mas por uma questão de respeito a uma cultura sobre a qual muita gente pouco se informa. E estar atento a detalhes pode abrir portas mais facilmente. Carolina lembra que o povo brasileiro é muito conhecido no mundo todo pela linguagem corporal (o toque, a fala que nem sempre é muito formal). Muitas vezes, são gestos que nem sempre são bem vistos, dependendo do país africano. “Evitar esses toques, muitos apertos de mão. Dependendo da população que você tá lidando, a sua linguagem precisa ser um pouco mais oficial”, diz, destacando que é preciso estar atento ao que “eles consideram respeito”. Na semana de celebração dos 200 anos da independência do Brasil, Carolina ajudou o embaixador Francisco Luz, que está à frente do consulado-geral do Brasil na cidade nigeriana de Lagos, a organizar a programação da série de eventos com foco em cultura, gastronomia e negócios, buscando reaproximar os dois países. O embaixador Ricardo Guerra de Araújo também participou do evento, que recebeu ainda uma delegação da FIRJAN. “Eu falei com um deles, na verdade, antes dele chegar, sobre essa importância da gente fazer uma adaptação da nossa cultura, que é uma cultura muito expressiva no continente africano. Nós somos muito bem recebidos. O Brasil carrega ainda um bom nome no continente africano, mas que na hora, às vezes, de fechar um negócio, pequenas barreiras são entraves”, frisou. A Nigéria tem a maior economia africana, com um PIB de mais de US$ 510 bilhões. O maior produtor de petróleo da África também se destaca nos setores de manufatura, financeiro, serviços, comunicações, tecnologia e entretenimento. Com Nollywood, a versão nigeriana de Hollywood, a indústria cinematográfica da Nigéria é uma das maiores do mundo. Estima-se que a população passe de 210 milhões de habitantes, como a do Brasil, com a diferença de que o país mais populoso da África, territorialmente (923,769 km2) seja bem menor que o Brasil (8,515,767 km2). Mas a Nigéria também é estigmatizada pelo terrorismo e o tráfico do drogas, com traficantes nigerianos atuando, inclusive, no Brasil. Desafios dos quais ela não se nega a falar e faz, inclusive, comparações entre os dois países para afastar qualquer possibilidade de se usar esses temas como desculpa para não conhecer e, quem sabe, investir na potência econômica africana. “Dependendo de onde você vai no Brasil é muito perigoso. Eu não recomendaria você passear em algumas regiões do Rio de Janeiro em determinados horários do dia, por exemplo. E a gente pode fazer uma leitura ampliada para Nigéria. Não recomendaria você ir a determinados lugares no norte do país, por exemplo, onde a gente tem a grande parte desses conflitos. Mas também não é todo norte”, afirmou. Sobre a presença do tráfico de drogas, ela disse que não se pode reduzir um país à atitude de indivíduos e que brasileiros também são julgados mundialmente por causa do tráfico de drogas. ”A gente precisa saber com quem a gente está falando”, frisa. Também para se evitar cair em golpes, ela exalta a importância de se aproximar de câmaras de comércio e canais oficiais das embaixadas brasileiras. “Problemas podem acontecer no meio do caminho, como em outros países, mas você já tem um filtro importante para lidar com essas pessoas”, afirmou. Embora trabalhe promovendo a conexão do Brasil com outros países também, percebe-se que Carolina é apaixonada pela Nigéria, especialmente. Aliás, paixão e Nigéria combinam perfeitamente na mesma frase em se tratando da vida dela, que conheceu o marido, e hoje sócio, nigeriano no lugar mais carioca que existe: a Lapa. “Dançando o ritmo mais latino-americano que existe, que é a salsa”, lembrou. Ele é empresário e produtor cultural. Depois de tê-lo conhecido, ela conta que começou a se aproximar também do Rei Ooni de Ifé, líder máximo da cultura iorubá no mundo, hoje assessorado pelo casal no Brasil. Educação antirracista Antes de viajar para Lagos, de onde ela falou com a reportagem, a brasileira, que também é professora, esteve em Gana, onde participou da Conferência Mundial de Educação e Restituição e exaltou a importância de uma educação antirracista conectada ao continente africano. Lembrou ainda que no ano que vem a lei 10639/2003 completará 20 anos. Essa lei estabelece a obrigatoriedade da inclusão da matéria História e Cultura Afro-Brasileira no currículo oficial da rede de ensino no Brasil. “Não existe outra maneira da gente tentar mudar, tanto a nossa visão do que que é África quanto a visão do que é Brasil para os africanos, que não seja através da educação”, frisou. Ela ainda completou dizendo que a educação antirracista tem o papel, que enfatiza ser fundamental, de recuperar a relação com o continente. “A gente precisa entender quem eram esses reinos, quais eram as culturas, como era a forma de organização, o que a gente tem de produção intelectual, cultural e científica antes da escravidão, que é uma parte na história. Uma parte crítica que alterou toda a nossa relação com o mundo”, completou. Carolina espera uma reaproximação do Brasil com o continente africano no próximo governo, seja ele qual for. E diz que a população também deve cobrar das autoridades essa reaproximação. “Nós, população afro, somos maioria e a gente tem interesse específico em expandir essas relações”, frisou. Em suas redes sociais, recheadas de fotos e comentários sobre esta mais recente passagem por países africanos, a historiadora não se cansa de repetir que não existe Brasil sem África.
    10/16/2022
    5:00
  • Nigéria ultrapassa Rússia no fornecimento de ureia ao Brasil
    Entre tantas consequências, a guerra na Ucrânia comprometeu as exportações russas, o que acabou favorecendo países como a Nigéria, que agora é o segundo maior exportador de ureia para o Brasil. Até o ano passado essa posição era ocupada pela Rússia. “A gente está falando de quase 19% do volume (total) de ureia que o Brasil importou (este ano)”, detalhou Fátima Giovanna Coviello Ferreira, diretora de Economia e Estatística da Associação Brasileira da Indústria Química (Abiquim). “Entre janeiro e abril, a Nigéria foi o principal fornecedor. Omã tomou essa posição a partir de maio”, acrescentou Francisco Luz, cônsul-geral do Brasil em Lagos, a maior cidade nigeriana. A diretora da Abiquim contou também que, comparando o volume importado pelo Brasil entre janeiro e agosto deste ano com o do mesmo período do ano passado, houve um aumento de 50%. “É um dado bastante expressivo”, disse. Em 2021, a maior economia africana era o quinto maior fornecedor deste fertilizante para o Brasil, respondendo por 10% de toda a ureia importada pela indústria brasileira. Ou seja: 2022 nem acabou e este volume já praticamente dobrou. O Catar atualmente está em terceiro lugar neste ranking e a Rússia em quarto. Dependência brasileira Neste campo, o Brasil ainda é bastante dependente do cenário internacional, importando quase 80% de toda a ureia usada em seu mercado de fertilizantes. No ano passado, a maior parte do produto vinha da Rússia e do Catar. “Por conta de toda essa crise no início do ano, nós ficamos muito preocupados com essa dependência excessiva da importação de fertilizantes vinda da Rússia. Então, a Nigéria acaba suprindo e dando ao Brasil uma oportunidade de diversificar a pauta de países com os quais a gente tem essa correlação na importação de ureia”, afirmou a diretora da Abiquim. O Brasil já importava ureia da Nigéria há anos, mas em volumes razoavelmente baixos. O interesse pelo insumo nigeriano aumentou depois da invasão à Ucrânia. “Porque era o único país onde projetos estavam sendo implementados para produção desse importante insumo para agricultura. Em outubro, a fábrica de fertilizantes da Dangote aqui em Lekki, no estado de Lagos, começou a produzir e a primeira produção já foi para o Brasil”, disse o cônsul. Pouco depois do início da guerra, o ministro das Relações Exteriores, Carlos França, teve uma conversa Aliko Dangote, dono desta fábrica e o homem mais rico do continente africano, sobre a possibilidade de garantir um fornecimento sustentável de ureia para o Brasil. Empresários brasileiros compram hoje 60% da produção nigeriana de ureia, desta e outras três empresas que fornecem este produto no país. Ciente de que a produção brasileira não é suficiente, William Marchió, consultor em projetos de agropecuária sustentável, defende que é preciso investimentos que diminuam a dependência de outros países. “Como os insumos mais importantes para produção, por exemplo, de milho, de grãos de uma maneira em geral, e boa parte da produção pecuária também, dependem do uso de fertilizantes nitrogenados, a produção interna é fundamental”, justificou. Ele ainda lembra que o coronavírus deu um motivo a mais para se pensar nisso. “Ainda mais quando você tem um exemplo de dois anos de pandemia, que dificultaram o uso de contêineres, de navios, de fluxo de importação. Muitas operações ficaram extremamente vulneráveis a isso. Então, a produção interna de ureados é fundamental. Porém, ela não é suficiente hoje. A gente ainda vai depender de importação”, disse. Ureia: realmente necessária? Este é o principal produto para fertilizar a agricultura brasileira. “Fertiliza a terra para que ela tenha uma maior produtividade”, contou Fátima. A ureia vem da cadeia produtiva do petróleo, a partir do gás natural. “Por isso que essa questão da Rússia ficou prejudicada. A Rússia é um país que tem muito gás natural, ela é competitiva na produção de fertilizantes derivados de gás”, explicou. A ureia é o nitrogenado mais utilizado na agricultura brasileira, segundo especialistas. “Nitrogênio é um dos elementos mais importantes para as plantas utilizarem como fonte de produção de massa, vamos dizer assim. Hoje a gente utiliza a ureia para fazer o milho crescer, para o capim, para a maioria das pastagens. Você usando 40 Kg de nitrogênio por hectare aumenta um animal em cima desse hectare, em termos de produção de pastagem”, explicou William. Uso de ureia é nocivo? Mas o uso deste tipo de produto é polêmico, principalmente em um momento em que se fala muito sobre agricultura orgânica. William Marchió diz que ureia não é nociva à saúde de ninguém, “a não ser que a pessoa ingira aquilo puro”. Ele considera essa “ferramenta interessante” fundamental na produção agrícola. Ao mesmo tempo em que diz que “não dá para ter boas produtividades sem o uso de fertilizante base ureado”, William aponta alternativas. Segundo ele, “uma das ferramentas tecnológicas que temos para diminuir ou mitigar o uso de ureia seria a fixação biológica de nitrogênio, usar bactérias para fazer a função da fixação de nitrogênio. Nós temos nitrogênio no nosso ar que respiramos. Essas bactérias são capazes de extrair esse nitrogênio do ar e entregar às plantas. Só que é um processo mais lento, é um processo que exige muita qualidade de solo, muito trabalho de condicionamento biológico do solo para que isso evolua”, disse. A Embrapa e outras instituições no Brasil fazem isso “com propriedade” e difundem essa ideia, de acordo com o especialista. “Só que nem todos os produtores conseguem fazer isso de maneira sistemática. A gente tem produtores hoje que são menos dependentes da ureia do que outros”, completou. Ainda sobre a polêmica em torno do uso de fertilizantes e defensivos agrícolas, a diretora da Abiquim os compara aos remédios usados pela maioria das pessoas e diz que diante da crescente demanda por alimentos, o uso desses produtos é fundamental. “Os produtos químicos são essenciais para que a gente tenha uma quantidade maior de alimentos para alimentar a população e o fertilizante é um deles”, concluiu. Impulsionando a relação Brasil-Nigéria Ureia, petróleo cru, nafta e gás natural representam 98% da importação brasileira vinda da Nigéria atualmente. As expectativas de crescimento de volume negociado nos próximos meses trazem otimismo sobre o aumento do fluxo comercial entre os dois países, que já foi bem maior do que atualmente. Analisando dados desde 1997, o fluxo comercial entre Brasil e Nigéria atingiu o pico em 2013, quando chegou a US$ 10,523 bilhões. Com um declínio que começou em 2015, chegou ao menor nível em 2020: US$1,22 bilhões. “Esses números eram inflados por causa da presença da Petrobras aqui, exportando o óleo que produzia aqui para o Brasil”, esclareceu o cônsul-geral em Lagos. “Este ano a nossa estimativa é que fique entre US$ 2,4 e 2,5 bilhões. Vai ser o melhor desde 2015, mas ainda vai ser um quarto do patamar que a gente operou entre 2008 e 2014, cujo comércio mínimo anual neste período foi de US$ 5,8 bilhões”, analisou. No período mencionado, a Nigéria era o principal parceiro comercial do Brasil no continente africano. Hoje ocupa a terceira posição, atrás do Marrocos e da África do Sul. Nos últimos dias, a notícia sobre a possibilidade de uma companhia aérea começar a operar voos semanais entre Brasil e Nigéria também animou empresários dos dois lados do atlântico. Isso significa que “os empresários vão ter mais facilidade de ir ao Brasil, a possibilidade de ter carga aérea direta mais barata e o crescimento do turismo também, que afeta a balança de serviços”, ressalta Francisco Luz. Quem já operou voos ligando diretamente os dois países foi a Varig, que entre os anos 80 e 90 chegou a ter um escritório na Nigéria. Nigerianos “descobriram” o Brasil Durante a pandemia, nigerianos “descobriram” o Brasil. O cônsul-geral do Brasil em Lagos conta que durante o surto, nigerianos começaram a ver o Brasil como um atraente destino turístico e de compras. “Turistas que iam fazer compras em Londres, Dubai ou em Nova York agora começaram a fazer compras em São Paulo, no Rio de Janeiro”, contou. Com isso, o consulado já emitiu este ano mais vistos entre janeiro e julho do que em todo o ano passado. “(Foram) 957 vistos só para o Brasil no ano passado inteiro. Este ano, já foram 1532 vistos”, detalhou. Ele acredita que até o fim do ano o número de vistos emitidos seja maior que o dobro do emitido no ano passado. O turismo religioso também é um nicho a ser explorado, pois a cultura Iorubá no Brasil é forte. O cônsul acredita também que facilmente exista uma demanda para pelo menos 20 mil turistas nigerianos visitarem o Brasil todos os anos, o que justificaria quatro voos semanais, sem contar ainda os turistas brasileiros e a diáspora africana vivendo no maior país da América do Sul. O Brasil possui embaixada na capital nigeriana, Abuja, comandada pelo embaixador Ricardo Guerra de Araújo, para tratar dos assuntos políticos multilaterais, de Defesa, e todo o relacionamento de governo a governo, e ainda o consulado-geral em Lagos, que cuida basicamente de assuntos consulares, comércio, cultura e educação, e trabalha com uma equipe restrita de cinco pessoas, incluindo o cônsul. Número claramente insuficiente para a expectativa de aumento de pedidos de vistos, o que representa metade do trabalho do consulado. As estimativas de crescimento são em várias áreas. Nollywood, a versão nigeriana de Hollywood, que faz da Nigéria um dos principais países do mundo em termos de produção cinematográfica, está começando a se interessar por coproduções com o Brasil. Sem falar que o país mais populoso do continente africano é hoje a nação com mais startups (mais de 5 mil) em África. Os desafios, como violência e tráfico de drogas, existem, como no Brasil. “A situação agora é assim, mas o empresariado está pensando a partir de 2030”, disse o cônsul, lembrando que Lagos não sofre com o problema do terrorismo que preocupa algumas regiões do norte nigeriano. “Em se tratando de criminalidade aqui, nos últimos relatórios mundiais de violência a Nigéria ficou no nível do Rio de Janeiro e abaixo de cidades como Baltimore e Detroit, nos Estados Unidos”, lembrou.
    10/9/2022
    5:04
  • Número de eleitores brasileiros na África aumenta, mas Brasil se afastou do continente promissor
    Neste ano, 3.332 brasileiros poderão participar da eleição presidencial estando em 17 países africanos. O número de cadastrados no continente é quase 22% maior que o de 2018. Na eleição passada, 2.734 eleitores se registraram, só que no segundo turno mais da metade (54,2%) nem sequer apareceu nos locais de votação africanos. O percentual de abstenção ficou acima de 50% em 11 desses países. Vinícius Assis, correspondente da RFI na África do Sul Em 2018, Jair Bolsonaro recebeu no segundo turno 57,5% dos votos de brasileiros residentes na África. Os dados são do Tribunal Regional Eleitoral do Distrito Federal (TRE-DF), responsável por zonas eleitorais no exterior, e de embaixadas e consulados do Brasil em países africanos. A maior parte do eleitorado brasileiro no continente está na África do Sul, uma das maiores economias da região. Adalton e Fernanda Barbosa são originários de Salvador (BA) e se mudaram para a Cidade do Cabo em 2019. Além de trabalharem como modelos, os dois abriram um negócio próprio e vendem comida brasileira. Neste ano votarão pela primeira vez no exterior. “É muito importante”, frisou Fernanda. Ela acredita que este seja o meio de alguém dar o melhor para a própria nação estando longe dela. O casal acabou justificando o voto em 2018 por estar viajando, mas não quis perder a chance de votar desta vez. “Não estou feliz com este atual governo e estou com uma expectativa grande de mudança", disse Adalton. "Meu voto é muito importante para contribuir para isso”, destacou. O casal está entre os 1.016 brasileiros que neste ano podem votar na África do Sul, número aproximadamente 19% superior ao pleito de quatro anos atrás. Na última eleição presidencial, 855 brasileiros se cadastraram para votar no país (605 em Pretória e 250 na Cidade do Cabo). No próximo dia 2 de outubro, haverá urnas eletrônicas em cada uma dessas duas cidades. A maioria dos brasileiros residentes na África do Sul vive em Pretória, Joanesburgo e Cidade do Cabo. Os perfis são diversos. Há estudantes, empresários, servidores públicos, pesquisadores, militares, missionários e acompanhantes de expatriados. No país africano que tem Cuba e China como dois dos principais aliados, alguns brasileiros se mostram mais próximos do socialismo, enquanto outros demonizam o comunismo. A empresária Ana Karato nasceu em Salesópolis, interior de São Paulo, e mora na África do Sul desde 2008. Ela votou no exterior pela primeira vez na eleição passada. Casada, mãe de três filhas, Karato conta que apenas a mais nova da casa, de 3 anos, não irá votar neste ano. A eleitora paulista estima que o presidente Jair Bolsonaro correspondeu em seu governo ao favoritismo que teve no continente na última eleição. Quando a reportagem pediu um exemplo de ação, inicialmente ela se referiu “a aviões fretados para que brasileiros fossem repatriados” durante a pandemia. Na verdade, em 2020, a embaixada brasileira no país contratou apenas um avião da South Africa Airways – e não vários – por cerca de R$ 2 milhões, para repatriar em torno de 250 brasileiros. Os passageiros foram dispensados de pagar diretamente os bilhetes. A empresária brasileira disse ainda que não tem motivos para reclamar sobre a atual relação bilateral entre Brasil e África do Sul. “Quem estiver no governo, independente de quem for, precisa colocar os interesses do país em primeiro lugar. Eu teria que fazer uma análise para ver o que que seria interessante para o Brasil“, afirmou. Ela diz achar “interessante que o Brasil não está mandando dinheiro para outro país”. “O importante é o Brasil se desenvolver. Então, para você se desenvolver, é como no meio dos negócios: você vende alguma coisa, a pessoa precisa comprar. Tem que haver uma troca, não pode ser somente de um lado”, disse. Governos brasileiro e sul-africano mais distantes Os 12 voos semanais que ligavam São Paulo e Joanesburgo até antes da pandemia já não existem mais, o que para Kika Ermel, operadora de turismo que vive na África do Sul há 15 anos, é um dos exemplos do crescente distanciamento entre os dois países. Aliás, ela disse que a relação Brasil-África do Sul parece estar indo ladeira abaixo. “Politicamente falando, vejo uma falta de conexão entre os dois países”, lamenta Ermel. “Cadê o BRICS?”, pergunta ela, indignada, referindo-se ao bloco do qual Brasil e África do Sul fazem parte, junto com Rússia, China e Índia. Especificamente sobre a falta dos voos diretos, ela lembra que o assunto não é apenas uma questão comercial. “Há que ter a vontade política”, frisou. Kika conta que antigamente se programava para viajar para o Brasil e votar, mas há anos desistiu de fazer isso e prefere justificar sua ausência das urnas. Com perfil assumidamente conservador, ela declara que se identifica mais com Bolsonaro do que com Lula, os dois favoritos nesta eleição brasileira, mas evita partidarizar suas respostas em se tratando de expectativas para o próximo governo. Ela acredita que a pressão de Bolsonaro para tentar nomear o bispo licenciado da igreja Universal Marcelo Crivella como embaixador do Brasil em Pretória talvez possa ter criado um certo mal-estar na relação entre os dois países. O que também tem deixado a empresária do ramo de turismo indignada é o fato da embaixada brasileira na capital sul-africana estar há meses sem um embaixador. Falta de embaixadores e queda de exportações no governo Bolsonaro Atualmente, outras embaixadas africanas estão com o posto de embaixador brasileiro vago, como, por exemplo, Moçambique. Depois do constrangimento diplomático com Crivella, o governo da África do Sul aceitou a indicação do diplomata Benedicto Fonseca Filho, o primeiro embaixador negro do Brasil, que atualmente é cônsul-geral em Boston, nos Estados Unidos. Mas ele ainda precisa passar pela sabatina do Senado. “Certamente isso só acontecerá depois das eleições”, disse à reportagem uma fonte do Itamaraty. Na avaliação de Mario Schettino Valente, professor de Relações Internacionais do Ibmec da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a ausência de um embaixador em um país indica falta de prioridade. Em sua premiada tese de doutorado, defendida em 2020, Valente estudou os efeitos da política externa brasileira sobre o comércio exterior. “A tese comprova, de forma estatística, que a abertura de embaixada aumenta o fluxo comercial, principalmente as exportações”, afirmou. Atualmente, o que o Brasil mais envia para a África do Sul são óleos combustíveis de petróleo e carnes. E o que mais compra dos sul-africanos são minerais: prata, platina e alumínio representam mais da metade das importações brasileiras na pauta bilateral. Ainda de acordo com Valente, em 2019, o Brasil registrou o menor valor de participação nas exportações para a África do Sul em 20 anos. No primeiro ano do governo Bolsonaro, este percentual foi de 0,50%, maior apenas que o registrado em 1999 (0,49%). A constatação de recuo comercial é a mesma ao se analisar dados da África Subsariana. “Os piores anos da participação da África Subsaariana nas exportações brasileiras, desde 2000, foram em 2019 (1,628%) e 2018 (1,654%)”, informou. Ele acredita que a redução das atividades da Petrobras no continente tenha afetado este fluxo. Política externa minimizada na campanha A política externa não parece ser uma prioridade para os candidatos à presidência em 2022, muito menos em se tratando da África. Dos 11 candidatos que disputam a corrida presidencial, três citaram o continente africano em seus planos de governo: Léo Péricles (UP), Lula (PT) e Sofia Manzano (PCB). Pablo Marçal até fez referência à região no seu programa de governo, mas o PROS retirou a candidatura dele. Enquanto países como Turquia, Estados Unidos, Rússia e China seguem buscando cada vez mais espaço no continente africano, o presidente do Instituto Brasil-África (IBRAF), João Bosco Monte, lembra que o Brasil vem se afastando desta região desde 2015, e esse distanciamento se intensificou no atual governo. Brasília não deu à África a atenção correspondente ao resultado das urnas no continente em 2018. Para o presidente do IBRAF, a imagem do Brasil no exterior não é a mesma de anos atrás e isso se dá, muito, pela forma com que o presidente Bolsonaro conduz sua política externa. Na África não é diferente. “O Brasil não está bem representado. O presidente Bolsonaro, durante os seus quase quatro anos de governo, sequer pensou e, de forma objetiva, materializou a relação próxima que o Brasil tinha com a África. Ele nunca viajou para nenhum dos países africanos. Isso é muito ruim, porque não demonstra uma aproximação e interesse do Brasil em conversar com a África”, analisou. Engana-se quem associa a África a um lugar que apenas precisa de ajuda humanitária. Especialistas consideram este “o continente do futuro”. Não se fala em produção de carros elétricos, por exemplo, sem colocar na discussão a República Democrática do Congo, um dos maiores produtores mundiais de coltan, ingrediente fundamental para a produção de baterias, inclusive de telefones celulares. Brasileiros esperam reaproximação entre Brasil e África No segundo turno, em 2018, o petista Fernando Haddad venceu a votação em seis países africanos: Cabo Verde, Costa do Marfim, Marrocos, Nigéria, Tanzânia e Quênia, para onde o missionário católico Pedro Mariano Pinheiro se mudou há sete meses. Ele também é de Salvador (BA) e vive a cerca de 170 km da capital queniana, Nairóbi. Pinheiro já está se programando para ir até a capital, a fim de votar no dia 2 de outubro. “Acho que cada voto é importante para fazer a diferença e tirar esse governo que está acabando com nosso país. Mesmo aqui eu preciso exercer meu dever de eleitor”, afirma. O missionário disse ainda que espera mais diálogo entre o Brasil e o continente africano no próximo governo. O desejo dele é o mesmo da professora universitária Ivanise Gomes. Há 8 anos, ela vive em Moçambique, que terá neste ano o segundo maior eleitorado brasileiro no continente africano: 673 inscritos, apenas dois eleitores a menos do que em 2018. A brasileira, que antes optou por justificar sua ausência, decidiu não deixar de votar desta vez. “Eu acho que o Brasil está passando por uma situação muitíssimo delicada, política e socialmente. Para mim, é como um grito de socorro. Espero que meu voto faça diferença para que essa situação se reverta, que as coisas melhorem para o Brasil. Acreditar nessa melhora também vai reverberar nos países africanos, porque existia um diálogo entre Brasil, Moçambique, África do Sul, os países do sul global, e que foi esvaziado, cessado nesse último governo. Eu acredito que isso possa voltar a acontecer”, declarou a professora. Ela ainda criticou a atual falta de incentivos a pesquisadores brasileiros e moçambicanos, como existia quando ela chegou à região. “Que essa relação (entre os dois países) volte a ser como era antes, com bastante intercâmbio de saberes, professores, estudantes, além de outras áreas onde há cooperação entre Brasil e Moçambique”, completou. Voto com cédula de papel Durante a produção desta reportagem, vários brasileiros que vivem em países africanos e demonstram apoio ao atual governo em redes sociais foram contatados, mas muitos deles disseram que não fizeram o cadastramento eleitoral a tempo. Por isso, não poderão votar no exterior. Em nove países africanos, o voto será com cédulas de papel, uma vez que o número de eleitores brasileiros cadastrados não passou de 100. Após o fim da votação e a contagem local dos votos, todos os resultados serão imediatamente enviados a Brasília.
    9/24/2022
    11:04

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